Navegar é preciso

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Não é chato nascer falante de português?

Eu tenho que confessar para vocês que, em determinado ponto da minha vida, eu me senti frustrado por ter nascido falante de português. Eu li um livro em algum lugar que explicava como todas as línguas e culturas tem nuances e pequenos detalhes, de forma que, por exemplo, apenas um falante nativo alemão consegue entender de fato, consegue captar inteiramente uma obra como Fausto, de Goethe. Você pode aprender alemão. Pode ler Goethe no original entendendo tudo. Mas jamais terá tanta capacidade de captar os nuances da língua quanto um nativo, porque te faltam os milhares de inputs culturais que só uma pessoa que nasce naquela cultura absorve. Mesmo que você aprenda inglês fluente, more 10 anos na Irlanda, você será incapaz de atingir todas as nuances e detalhes de Ulyses, do James Joyce. Você consegue ler, lógico, vai gostar, é uma boa obra. Mas você vai captar apenas uma fração das referências culturais da obra.
Você está condenado a ser capaz de sentir apenas uma língua em toda a sua extensão e, putz, com tantos escritores ingleses, alemães, franceses, russos, eu fui nascer logo num pais que fala português. Que azar.
Essa frustração passou, pelo menos para mim, quando eu li o poema “Minha Irmã”, de Cora Coralina. E me dei conta que seria impossível explicar para alguém de fora todas as nuances e detalhes que tem escrito ali. Algum estrangeiro pode aprender português, lógico, vai entender o conto, vai até chagar a conclusão que é um bom conto. Mas duvido que alguém sem a nossa visão cultural chegue ao nível de emoção que tal poema me levou. Mas, definitivamente, só mais tarde na vida, eu conheci Fernando Pessoa e consegui ler e entender Fernando Pessoa, que eu me toquei: Que bom que eu nasci falando português.

Existem uma frase de Fernando Pessoa que muita gente conhece, mas pouca gente entende o qual redpilante ela é: Navegar é preciso, viver não é preciso. A beleza dessa frase é que ela usa a palavra “preciso” em dois significados diferentes e é válida em ambos. Preciso pode significar necessário. Navegar é preciso, viver não é preciso. Precisamos navegar, mesmo que isso implique em nossa morte. Precisamos pensar adiante, ter um rumo, mesmo sabendo que nossa vida é limitada. Mas muita gente esquece do outro significado. Preciso pode significar com precisão, com exatidão. Navegar é uma atividade de precisão, são inúmeras contas e instrumentos necessários para se navegar. Navegar é preciso, viver não é preciso. Para buscarmos nossos objetivos, temos que ser exatos preciso, mas nossa vida jamais vai ser matemática e racional. Para viver precisamos conviver com inexatidão.
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Комментарии
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Esqueceu do discurso da dilma, só quem é brasileiro compreende a magnitude das perolas da dilma, que o livre mercado não poderia conceber.

kmagno
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KeviPegoraro