Fio de Bigode - Os Angüeras - Festival da Barranca 1981

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De José Lewis Bicca e Apparício Silva Rillo
Interpretação: Os Angüeras

Quinze quadras de campo, meu compadre!
São minhas, meu compadre, aperte a mão
Contratos de pura consciência
Timbrados de coração

Era o fio do bigode que valia
Nas transações multivárias dos avós
Escrituras formais sacramentadas
Nos cartórios e então tempos após

O compromisso firmado boca a boca
O negócio empenhado, trato feito
Valiam muito mais que o texto escrito
Pelos conformes e artigos do direito

Tinha a palavra o peso de uma bíblia
Recuerdo lindo que à memória acode
De quando os tauras empenhavam honras
Pelo fio já grisalho de um bigode

UM COMÍCIO DE ESPÍRITOS

Nada acontece por acaso, segundo a teoria dos racionalistas (estes caras que são alimentados a ração balanceada. Talvez tenham lá suas razões, os cujos. Menos no que se refere ao festival da Barranca. Este nasceu por acaso como os nenês de novembro, frutos da semeadura suada do carnaval.
Pois sucede que o pessoal de Os Angüeras e mais alguns de achego, desde pelo menos 1965, realizavam duas grandes pescarias no ano: uma na semana santa, outra em setembro. A primeira para o tradicional jejum de carne (mulheres não nos acompanhavam e até hoje não). A outra na semana da pátria, para escapar (desculpa ...) dos chatíssimos desfiles que são a tônica da efeméride cívica.
Para uma e outra pescaria vinham de Porto Alegre o Antônio Augusto Fagundes (Nico) e o Carlinhos Castilhos (Passaronga), com o Juarez Bittencourt (Xuxu) algumas vezes e, quando em quando, com outras caras mais ou menos simpáticas.
E aí aconteceu. Por acaso, repito, contrariando os racionalistas. A gente estava no "Pesqueiro da Bomba", no Rio Uruguai, na semana santa de 1972. Havia tomado umas que outras, alguém falou na Califórnia da Canção acontecida em primeira edição no dezembro anterior, em Uruguaiana, quando uma voz (acho que do Passaronga, outros acham que outro, há quem jure que de um espírito) sugeriu - E se a gente fizesse o nosso festival? Aqui mesmo, no improviso, na barranca do Rio?
... E então, naquela semana santa, noite de quinta-feira, ficou assentado em cepo de três pernas que se faria o festival. O tio Manduca (disso sim, me lembro) propôs que as composições tivessem por base, tema único, nomeou-se o presidente da "comissão" e lascou o tema "Acampamento de pescaria". E aditou, enquanto me filava o trigésimo oitavo cigarro daquele dia: - Sábado de noite os artistas se apresentam. Vocês têm o dia todo de amanhã para trabalhar o tema. Tá resolvido...
... Houve três concorrentes neste primeiro festival da Barranca, que, naquela época e porque estava em seu início, não merecia as maiúsculas que lhe dou. Carlinhos Castilhos, só e mal acompanhado; Nico Fagundes com "fuça" no violão e, em dupla Zé Bicca e esta voz que vos fala.
Apresentadas as composições, por ordem de sorteio, cantou o Carlinhos (palmas, palmas, palmas), cantou o Bicca (idem, idem, e idem) e finalmente o Nico (ibidem, ibidem e ibidem). A plateia, meio sobre a empolgação, assentava-se em semicírculo. Todos (eu disse todos) votaram. Menos os concorrentes, claro. Ganhou o Nico, com "Eu e o Rio" - hoje gravada, como tantas composições que nasceram na Barranca para ganhar alguns dos mais importantes festivais nativistas do Estado.
O detalhe, nisso tudo, é que a composição vencedora (linda, a melhor da noite), nada tinha a ver com o tema proposto. Cantava a relação espiritual de um amante descornado com as águas do Uruguai. Mas o fato é que ganhou. O que prova, desde a idade da pedra dos festivais nativistas, que júri deste tipo de evento não é flor de cheirar com pouca venta.
A confraternização foi geral, o vencedor queria por que queria o prêmio (mas que prêmio, caracos?). O Milton Souza ganiçava de raiva porque lhe haviam estragado a gravação (para a rádio São Miguel, ouviram?) por intervenções de calão não recomendável, eu achei que estava uma beleza, nada como o autêntico e o espontâneo para valorizar uma reportagem... Aí o Milton me olhou de esquadro e eu saí pelo arrabalde. Pensando que se Deus me desse saúde, engenho e arte, um dia eu ia escrever este episódio.
O que faço, vinte anos mais velho, mas feliz. Porque o festival da Barranca, nesse tempo, depois de catorze edições, faz por merecer as maiúsculas que agora lhe confiro.

Apparício Silva Rillo - 1985
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